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A sazão d'a Cozinha

Sustentabilidade

“Ou os homens entram nelas, ou, passada a sazão, o caule começará a quebrar, a espiga adesfazer-se, e todo o grão, caído, alimentará os pássaros, alguns insectos, até que, para não se perder tudo, se meterão os gados às searas como se vivêssemos na terra da fartura … “ in Levantando do Chão. José de Saramago, 1980

Sou do tempo em que existiam as quatro estações bem definidas. O nosso corpo e a nossa mente quase adivinhavam o dia em que as estações mudavam. Pressentíamos a mudança, antes mesmo da Natureza começar a dar os seus sinais. Depois, vinham novas cores e novos cheiros e com eles novos aromas e sabores, que se sentiam ao redor das casas.

Na minha geração tínhamos bem presente quando o corpo pedia comidas mais robustas, que aquecessem a alma das geadas do Inverno, e pratos mais ligeiros que refrescassem os corpos do calor do Verão. Recordo-me da existência de dois momentos particularmente belos: a saída do verão que cheirava a uvas e “reflexão”, e a saída do Inverno onde assistíamos, na Paisagem, a uma impressionante explosão de cores; até então adormecidas. Estes dois momentos preparavam o nosso corpo e mente para os extremos que se seguiriam.

Hoje, tudo isso constitui a memória que tentamos preservar. Sinto-me feliz e afortunado por guardar essa memória. A memória das estações. Isto faz com que sinta alguma propriedade para trazer ao meu restaurante o tema das estações e da sazonalidade. Posteriormente, escreverei sobre o problema das Alterações Climáticas com consequências diretas na definição clara das estações e na sazonalidade dos produtos. Realço que, apesar de se falar das Alterações Climáticas como algo real que está a mudar o Planeta, ainda sou da geração (tal como escrevi anteriormente) que sentia a mudança das estações e é, por isso, extraordinariamente importante manter essa memória e preservá-la como um legado para as futuras gerações.

Não sendo um entendido em etimologia, a minha curiosidade levou-me a procurar a origem das palavras sobre as quais se dedicam este artigo: sazonalidade e estações. Após uma breve consulta aqui e ali, encontro uma direção. Em português, a palavra sazonal vem do latim satio. A palavra "satio" vem do verbo em latim "serere", que significa plantar ou semear. Originalmente, "satio" significava o ato de plantar ou semear a terra.

Posteriormente, "satio" passou a significar o tempo em que se semeia a terra (que era principalmente durante a primavera). Assim, a palavra "satio" ficou associada à primavera, ganhando desta forma, uma ligação com as estações do ano. Na língua portuguesa, a palavra estação não deriva de "satio". Estação vem do latim "stationis", que significa o estado fixo de alguma coisa. Em contrapartida, em outras línguas, a palavra estação deriva de "satio". Dois exemplos disso são o francês "saison" e o inglês "season". Foi, provavelmente, a partir de uma dessas línguas que surgiu a palavra sazonal em português (estrangeirismo, portanto). Num passado recente, existiam claramente quatro "sationis"; cada uma definida por um período de tempo onde as condições climatéricas, embora distintas entre elas, se mantinham mais ou menos constantes. Assim, tínhamos o Veris, que quer dizer “bom tempo” (verão), a primo vere, que quer dizer “primeiro verão”. O “Tempus hibernus” ou o tempo de hibernar (inverno), e o “Tempus autumnus” ou o tempo do ocaso (da queda, declínio, ruína ou fim; neste caso, a queda da folha….). E as estações ditavam o ciclo da Natureza e, com isso, as sementes disponíveis para "serere" que originavam os produtos a serem cozinhados e dos quais resultavam pratos característicos de cada "sationis". Nesse tempo, nas nossas mentes e nas nossas cozinhas, tudo parecia ser mais claro. Concluo esta lógica de pensamento referindo que, nesse tempo, tínhamos quatro estações às quais era subjacente a sazonalidade dos produtos.

O que significa para nós, a Cozinha, a questão da sazonalidade? Como reproduzimos na prática este conceito?De uma forma prática diria que o processo pode ser representado por dois ciclos. A azul o processo principal, a verde o complementar.

A minha memória traz-me sabores e aromas característicos, que ainda associo a determinadas estações do ano. Essa memória leva-me a procurar os produtos e os respetivos produtores. Assente na cozinha tradicional, procuro com estes produtos estabelecer um conceito inovador. Quando o conceito está estabelecido, dou início à fase de experimentação, criando e recriando, conciliando múltiplas combinações, ouvindo as sugestões da equipa, até à versão final que é apresentada ao cliente. A fase de experimentação é sempre baseada num processo de pura criatividade aproximando o resultado à memória.

Se, entretanto, acabar a temporada de um determinado produto, ou o produtor deixar de ter esse produto disponível, pode haver a necessidade de procurar novos produtos que substituam o inicial, sem perder o conceito que se estabeleceu. Pode acontecer uma situação ligeiramente diferente e que resulta da existência de novos produtos (ciclo verde). Novos nos dois sentidos. Novos por não ter memória deles, ou novos porque, de facto, os produtores também vão fazendo a sua própria cultura de experimentação. Nos dois casos é necessário desenvolver um processo criativo que incorpore o estudo e a experimentação.

Concluo, referindo que trabalhar o que a Natureza nos dá é desafiante, porque exige constante criatividade e experimentação. Ressalvo que “cozinhar o que a Natureza nos dá”, começa a ser diferente de “cozinhar ao ritmo das estações”, porque estas estão a mudar. O Sistema Alimentar já começa a sentir as consequências da mudança …. Resta-nos a memória, que será importante preservar como legado para as futuras gerações.